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segunda-feira, 26 de abril de 2010

Ações Afirmativas e o marco histórico das discussões raciais.

Parabenizo cada militante negro que se dispôs a ir pro embate frontal com a lógica sistemática racista em prol da efetivação dos direitos sociais, do princípio da igualdade e da inclusão das negras e negros na sociedade brasileira ex-escravocata. Já alcançamos uma vitória, saimos do silêncio, paramos de discutir pra dentro e fomos colocar o dedo na cara dos verdadeiros opositores. A Política de Ação Afirmativa na Educação Superior veio como um divisor de águas da história brasileira em relação à postura estatal frente aos afrodescendentes esquecidos aqui depois do fim do tráfico negreiro e abolição legal da escravatura.
Não podemos esquecer que desde 1889 os negros trazidos nos navios negreiros e seus ascendentes esperam por inclusão nas políticas públicas e no acesso aos direitos sociais. Acredito que tenha chegado a hora e que nossa Suprema Corte Constitucional esteja sensível a isso.
O Poder Judiciário brasileiro vive um momento histórico ao colocar na pauta de discussões as políticas públicas voltadas à educação da população negra e indígena.

            O STF, corte suprema pátria fez em março do corrente ano uma Audiência Pública com especialistas de diversas áreas do conhecimento para discutir a constitucionalidade ou não das Cotas Raciais que estão sendo implementadas em universidades públicas do país. A proposta foi feita pelo Min. Relator da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF nº 186), Ricardo Lewandowski, que foi ajuizada pelo Partido Democratas alegando a inconstitucionalidade das políticas afirmativas na Universidade de Brasília.
O MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL RICARDO LEWANDOWSKI, Relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 186 e do Recurso Extraordinário 597.285/RS, no uso das atribuições[...] CONVOCA: Audiência Pública para ouvir o depoimento de pessoas com experiência e autoridade em matéria de políticas de ação afirmativa no ensino superior. No que tange à arguição de descumprimento de preceito fundamental, a ação foi proposta contra atos administrativos que resultaram na utilização de critérios raciais para programas de admissão na Universidade de Brasília - UnB. Os dispositivos tidos por afrontados são os artigos 1º, caput e III, 3º, IV, 4º, VIII, 5º, I, II, XXXIII, XLII e LIV, 37, caput, 205, 206, caput e I, 207, caput, e 208, V, da Constituição Federal. [...] O debate em questão consubstancia-se na constitucionalidade do sistema de reserva de vagas, baseado em critérios raciais, como forma de ação afirmativa de inclusão no ensino superior.[...] (ADPF 186, Min. Rel. Ricardo Lewandowski)
Diante da discussão posta, antes mesmo da Audiência, muitos juristas, sobretudo constitucionalistas, se permitiram sair do silêncio latente em que permaneciam quando se tratava desse assunto. Em manuais e cursos de Direito Constitucional passavam pelos capítulos dos Direito Fundamentais Sociais sem abordar o assunto, mas hoje se vêem impossibilitados de deixar passar despercebido pelo clamor do mundo jurídico e dos movimentos sociais que imploram por uma resposta aos questionamentos feitos pelos contrários e favoráveis às políticas afirmativas. Autores como Manoel Jorge e Silva Neto, trouxeram a discussão à baila e o citado jurista diz que:
Defende-se também que a ação afirmativa viola o princípio da igualdade porque contempla discriminação reversa (reverse discrimination). O termo surgiu nos Estados Unidos para criticar a ação afirmativa dos fundamentos de que as atuais gerações não têm responsabilidade com a discriminação praticada no passado. (SILVA NETO, 2008, p. 620)
            Contudo, essa não é a posição unânime de juristas, estudantes, ministros, juízes, leigos e cotistas[1]. Fundamentos históricos, sociológicos, legais, constitucionais e, sobretudo, ideológicos, são lançados à mesa e inseridos nessa discussão que remonta aos 510 anos de história oficial[2] do país, mas que só foi colocado em pauta nesse momento. E é se reportando à história que o supracitado autor, em mesma obra, coloca seu posicionamento: “E recorde-se que a mesma resistência oposta no passado às normas de direito social agora se opõe com relação às políticas afirmativas, seja aqui no Brasil ou nos Estados Unidos.” (SILVA NETO, 2008, p. 620)
Tendo isso em vista, comecei esse ano o meu trabalho de conclusão de curso em Direito colocando mais lenha na fogueira da discussão das ações afirmativas tendo em vista sua relevância associada ao momento ímpar em que o país vive na discussão de políticas públicas voltadas aos grupos sociais vulnerabilizados e marginalizados[3] pela história e que não foram, posteriormente, reparadas pelos danos causados pelo próprio Estado em momento histórico passado, mas não remoto.[4] Portanto, no trabalho que me dispus a elaborar, pretendo fazer um apanhado da discussão feita, colocando em foco o constitucionalismo brasileiro, sobretudo no que diz respeito aos direitos sociais, destacando os aspectos normativos, especialmente as normas programáticas frente à reserva do possível.
Espero trazer mais novidades e melhores informações da minha pesquisa.



[1] Termo vulgarmente utilizado para referir-se aos estudantes que ingressaram pelo sistema de cotas das ações afirmativas implementadas nas universidades públicas do país. Ou seja, quem entrou pelas cotas, chamar-se-á, vulgarmente, cotista. O termo é cotidianamente utilizado, apesar de não ter sido impregnado de preconceito, visto que foram os próprio estudantes ingressantes pelo sistema de cotas que adotaram o termo e hoje o utilizam como forma de auto-afirmação enquanto oriundos de colégios públicos e em sua maioria, negros, e não como mendicantes intelectuais.
[2] Oficial por que é a História que está nos livros, mas não necessariamente a única. Afinal, antes do “achado” de Pedro Álvares Cabral, aqui era terra de Índio e “todo dia era dia de índio”, como canta Jorge Ben.
[3] No sentido literal de colocados À margem da sociedade como se dela não fizessem parte.
[4] É recente, posto que não é remota, a história da escravização dos africanos e afro-descendentes no Brasil, além do extermínio e apropriação indevida das terras indígenas. Isso pode ser afirmada sem receio de pecado, afinal, se passam mesquinhos 188 anos da Independência do Brasil do colonizador Português e apenas 121 da abolição da escravatura.

domingo, 11 de abril de 2010

A COR DO AMOR

E o amor tem cor??? A prioristicamente, qualquer um responderia que não. Mas eu digo que sim! E digo que sim repassando mentalmente as discussões que ocorreram recentemente em uma lista virtual sobre as relações interraciais. 
O que faz um homem ou uma mulher pensarem no seu par ideal para manter uma relação? Todos aqueles adjetivos clichês aparecem: bonito, inteligente, educado, esforçado, trabalhador, militante, amoroso, elegante, etc. E optar por se relacionar com o outro nada mais é do que dizer que aquela determinada pessoa tem as características que você quer na medida em que você precisa, mesmo que depois de iniciada a relação você perceba que caiu em uma furada e a embalagem trazia um produto insoso ou mesmo amargo.
De toda sorte, por que homens negros, sobretudo os em melhores condições financeiras e sociais, optam raramente por se relacionarem com mulheres também negras? Talvez por que esses ideiais de beleza, inteligência, elegânciae até do amor mais romântico estejam desenhados em esculturas de cores claros, traços finos e cabelos lisamente sedosos. 
E com certeza, não irá faltar quem pergunte: e o amor? O amor não conta? Mas e eu respondo com umas outras perguntas: e o que é o amor? O que faz alguém se apaixonar por outrem se não a adimiração e idealização do que lhe é aprazível no outro, o conforto pessoal e emocional que aquela pessoa lhe proporciona e todas as outras flores dessa primavera sentimental?

Dizer que o amor tem cor não significa dizer que negras/os só devam se relacionar com negros/as e brancas/os só devam se relacionar com brancos/os por que a ninguém é dado o direito de simplesmente mirar o seu ofá de cupido apenas para os corações de mesma raça numa tentativa desesperada de evitar as relações interraciais. Mas se Kabunguele Munanga tanto nos trouxe acerca da descolonização do conhecimento, não podemos nos furtar dessas descolonização, inclusive, nas nossa relações. Por que eu, enquanto candomblecista e ex-cética não acredito em coincidências e certamente isso não é privilégio só meu.
O que não dá é pra criticarmos Ronaldo, Robinho e outros jogadores de futebol e pagodeiros por que eles saem da favela pra ser riqueza e fama e ao lado de casa um deles posam mulheres brancas enquanto quem está aqui embaixo discutindo exatamente esses padrões escolhidos por eles para carregar como mais um troféu, quando se está fazendo a mesma opção, ainda que não para ter um troféu, mas para ficar confortável no transitar desse ou daquele determinado espaço... ou mesmo por que se quer viver um romance e nossa literatura ainda anda pobre de princesas negras.

Podemos viver o amor que quisermos, desde que sem esquecer ou negligenciar os refenciais que cansamos de publicar em textos, músicas, poemas, discussoes virtuais e tudo o mais que cansamos de gastar em escrita e voz. Além de todos os nosso algozes históricos, temos nossos espelhos e nossos ecos.